terça-feira, 29 de novembro de 2022

Cedae usa provadores para controlar qualidade da água tratada no Rio


RIO / BAIXADA - Por exigência da função específica que hoje exerce na Cedae, o técnico de laboratório Alexandro Pereira da Silva não pode tomar um cafezinho sequer pela manhã nem passar perfume ou desodorante antes de sair de casa. Além disso, seu almoço é devidamente regulado, não podendo ter alimentos muito temperados. Essas e outras restrições têm o objetivo de preservar o seu paladar e fazem parte da sua rotina como “sommelier de água”. Alexandro e outras 14 pessoas são responsáveis por, diariamente, provarem amostras captadas na Bacia do Rio Guandu e tratadas, avaliando se a água está própria para consumo e apta a ser distribuída para a população da Região Metropolitana do Rio. O grupo integra o painel sensorial do Laboratório de Análise de Pesquisa da Água (Libra) da companhia.

Mas, para além do controle alimentar, a maior dificuldade enfrentada por Alexandro e seus colegas sommeliers no dia a dia é conseguir explicar a natureza da sua atividade para familiares e amigos.

— Quando eu descrevo meu trabalho em casa ou para os meus amigos, a maioria não entende e vem sempre a mesma pergunta: “Você é provador de água? Água não tem gosto”. Então, eu respondo: “Mas esse é o objetivo. Não é para ter gosto”. O legal dessa análise é que os nossos sensores, a nossa língua e o nosso nariz, são mais eficientes do que os equipamentos de laboratório. Nós percebemos traços que só um aparato muito caro poderia identificar — conta o técnico.

Novidade contra crise
A criação da equipe é uma das respostas da Cedae à crise da geosmina, vivida pela população da Região Metropolitana do Rio nos últimos três verões. Uma empresa foi contratada em 2021 e deu um curso de formação para técnicos da própria companhia, que passaram a exercer a nova função no fim do ano passado e também a treinar outros profissionais.

— A gente percebeu que os maiores provadores da água eram a própria população. Eles que sentem na ponta do consumo quando há algum problema. Por isso, havia a necessidade de montar uma equipe especializada para provar essa água ainda na saída da estação — explica o diretor de Saneamento e Grande Operação da Cedae, Daniel Okumura. — Anteriormente, a análise de gosto era feita por meio de contratação de uma empresa, e, com isso, o retorno dos resultados levava de três a cinco dias. Montar esse grupo nos fez ganhar mais celeridade no processo.

Miguel Fernandez, presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental do Rio de Janeiro (ABES/Rio), diz que a água testada apresentou bons resultados nos últimos meses:

– Não é padrão essa metodologia, implementada depois da crise. Mas, é algo positivo, que traz mais transparência para a população.

Fazer parte da equipe de sommeliers não é para qualquer funcionário. Os técnicos não só têm que seguir regras rígidas nas refeições como também não podem ser fumantes. No curso, eles são treinados de forma a apurar o paladar e o olfato para conseguirem identificar em níveis mínimos qualquer alteração de sabor e odor na água. Para atingir tal refinamento, é preciso muita dedicação e prática, mesmo fora dos horários de trabalho. Todos eles recebem adicional de insalubridade no contracheque por conta do cargo ainda meio inusitado.

Teste sem sabor
A equipe do GLOBO acompanhou um dos testes realizados no Libra na última semana. Os seis funcionários escalados para fazer a prova de água do dia receberam cinco amostras sem identificação. Algumas foram propositalmente contaminadas com pequenas quantidades de geosmina para que os participantes fizessem a diferenciação. Antes de iniciar o teste, eles tomam a chamada água reagente, produzida no laboratório e capaz de limpar e afinar o paladar para o exame.

— Eu costumo falar para as pessoas que a gente degusta água. Explico também um pouco sobre como essa análise é importante, ainda mais depois do episódio da geosmina no Rio — afirma a sommelier de água Thelma Rafaela Torres.

O coordenador de controle de qualidade do Libra, Robson Campos, que é formado em química, fez parte da primeira equipe de sommeliers da Cedae. De acordo com ele, nas amostras de águas do teste, a quantidade de produtos utilizados para alterar o odor e o sabor é mínima, não trazendo qualquer danos à saúde dos técnicos.

— Nós seguimos uma metodologia internacional que é consagrada na normativa e também é utilizada por outras empresas de saneamento, como a Sabesp (do Estado de São Paulo) e a Copasa (de Minas Gerais). Classificamos a água em quatro sabores: salgado, amargo, azedo e doce. Já as notas fazem parte dessa mesma escala internacional e variam de 1 a 12. Um é uma água limpa, linear, quase imperceptível. Quando vai chegando a 12 é porque há elementos fortes — afirma o coordenador do Libra, ressaltando: — A legislação brasileira prevê o limite de seis para a água ser disponibilizada para consumo. Aqui, quando o gosto sai de 1 para 2, nós já acionamos nosso plano.

Somadas as contratações da empresa que deu o curso de formação para os sommeliers da Cedae e mais os aperfeiçoamentos posteriores, o investimento total para a criação da equipe foi de cerca de R$ 500 mil. Além disso, a companhia investiu outros R$ 4,5 milhões na compra de equipamentos e na atualização tecnológica para a instalação do Laboratório de Análise de Pesquisa da Água. Com tudo isso, a empresa faz uma promessa aos fluminenses: a de que não haverá problemas com a água das torneiras nesse verão.

Via: Jornal Extra

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